Para analistas, o fato mais relevante da decisão do Comitê de Política Monetária do Banco Central foi a divergência entre os diretores indicados por Bolsonaro e os indicados por Lula. A avaliação é de que a divisão permaneça nas próximas rodadas

Por: Rosana Hessel – Correio Braziliense / FONTE: DP

Como esperado, o Banco Central desacelerou o ritmo de corte dos juros e reduziu, nesta quarta-feira (8), a taxa básica da economia (Selic) em 0,25 ponto porcentual, para 10,50% ao ano, em uma reunião dividida entre os nove diretores do Comitê de Política Monetária (Copom). Após o comunicado apontando o fim do consenso entre a diretoria do BC, analistas veem que, nas próximas reuniões, haverá novas divergências, especialmente em relação à taxa terminal do ciclo de afrouxamento dos juros.

No terceiro encontro do Copom do ano e o primeiro após a mudança na meta fiscal no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2025, enviado no mês passado ao Congresso Nacional, o colegiado pôs uma pá de cal no consenso entre as alas ortodoxa (mais dura em relação ao controle da inflação) e a heterodoxa (mais leniente com a alta de preços), que vinha ocorrendo desde a troca de governo. O grupo liderado pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto, e composto pelos diretores mais antigos e escolhidos pelo ex-presidente Jair Bolsonaro — Carolina de Assis Barros, Diogo Abry Guillen, Otávio Ribeiro Damaso e Renato Dias de Brito Gomes — optou pelo corte menor, de 0,25 ponto percentual. Já os diretores indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, liderados pelo ex-secretário executivo do Ministério da Fazenda, Gabriel Galípolo, que é cotado para substituir Campos Neto no fim do ano — Ailton de Aquino Santos, Paulo Picchetti e Rodrigo Alves Teixeira — , votaram pela redução de 0,50 ponto percentual.

No comunicado, o Copom reforçou a cautela no processo de afrouxamento dos juros e destacou que a conjuntura atual, “demanda serenidade e moderação na condução da política monetária”, devido ao cenário externo mais incerto e mais desafiador e com um processo desinflacionário doméstico que tende a ser mais lento, com expectativas de inflação desancoradas. O comitê apontou que “a política monetária deve se manter contracionista até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas”.

Apesar de não sinalizar qual seria o corte da próxima reunião, o comunicado destacou que “a extensão e a adequação de ajustes futuros na taxa de juros serão ditadas pelo firme compromisso de convergência da inflação à meta”. “Ficou claro, como esperado, a divisão entre ortodoxos versus heterodoxos, novamente, e a pressão que o governo vai fazer favorável à turma heterodoxa. Por enquanto, o Banco Central está protegido, e os juros vão cair lentamente, para 9,75% ao ano, talvez acima disso, porque a maioria ainda é ortodoxa”, destacou Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. Para ele, não vai haver discussão sobre a próxima decisão, “mas a próxima divisão será sobre a taxa terminal” entre as duas alas.

“Os heterodoxos vão tentar levar a Selic para números menores do que o mercado está estimando. É um sinal do que teremos pela frente. Uma decisão de presidência favorável ao Gabriel Galípolo, teremos um BC ainda mais heterodoxo com as escolhas no fim do ano e um BC problemático nos últimos dois anos do governo Lula”, alertou Vale.

Juros reais elevados

Com esse resultado, o Brasil segue na vice-liderança do ranking de juros reais (descontada a inflação), atrás apenas da Rússia, conforme dados levantados pelo economista Jason Vieira, da MoneYou. Na avaliação de Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV, que esperava redução de 0,50 ponto percentual na Selic, os juros básicos do Brasil estão elevados e há espaço para corte maior. “Mas, na nossa visão, esse corte menor faz sentido. Basicamente, há expansão fiscal, o mercado de trabalho está apertado, há pressão da inflação de serviços e expectativas de inflação desancoradas. Tudo isso justifica uma cautela maior na condução da política monetária”, afirmou.

Ele contou que esperava que essa cautela começaria apenas na próxima reunião do Copom, marcada para os dias 18 e 19 de junho. Para Padovani, o ritmo de corte na próxima reunião deverá ser mantido em 0,25 ponto percentual. “O que vai entrar no debate agora é a taxa terminal. Tem muita gente achando que a Selic pode ir para mais perto 9,75%. Mas eu continuo achando que os juros reais são muito altos e tem espaço para para cortar juros. E,por isso, o próximo presidente do Banco Central vai tomar mais riscos”, acrescentou.

Setor produtivo

Apesar das críticas à redução do ritmo do corte, entidades empresariais reconheceram a importância da cautela da autoridade monetária no processo de redução dos juros. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) consideraram a decisão “inadequada”. A Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit),defendeu a continuidade do processo de redução dos juros, porém, reconheceu que isso só será possível “se o quadro fiscal estiver equilibrado e em sintonia com a política monetária”.A Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), destacou a importância de o BC continuar comprometido com a redução da Selic “no longo prazo e de forma sustentável”. “A redução na intensidade da queda de 0,5% para 0,25% mostra a preocupação do Banco Central em controlara inflação e também é reflexo de um momento mais adverso da economia mundial, onde os Estados Unidos estão tendo que retardar o processo de queda nos juros”, completou.

As informações são do Correio Braziliense. 

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