Neste artigo, o especialista comenta a respeito do anúncio do pacote fiscal e o que esperar do futuro da economia.
FONTE: CONTÁBEIS
Na semana passada, o governo anunciou detalhes do pacote fiscal, com a promessa de gerar uma economia de R$ 70 bilhões em dois anos — o suficiente, segundo o próprio, para atender às metas do arcabouço fiscal.
Apesar de possibilitar o cumprimento dessas metas, a iniciativa está longe de ser satisfatória para lidar com as dificuldades estruturais das contas públicas. Isso acontece porque o ponto crítico continua sendo a relação entre dívida e Produto Interno Bruto (PIB), que, se não estabilizada, comprometerá o crescimento sustentável no longo prazo.
Embora tímido, o pacote apresenta aspectos positivos. Sem ele, a reação do mercado seria ainda mais negativa. Por exemplo, a adoção de uma regra para o crescimento do salário mínimo — estabelecendo limites que variam entre 0,6% e 2,5% acima da inflação — é um avanço em relação ao modelo anterior, que vinculava diretamente o aumento ao crescimento real do PIB. Contudo, se a produtividade não acompanhar, essa medida pode gerar pressões inflacionárias, reforçando a necessidade de cautela.
Quanto à previdência dos militares, as alterações têm mais efeito moral do que econômico. Ajustes como a extinção da “morte fictícia” — que permite o pagamento de pensão mesmo após a expulsão do militar — e a imposição de idade mínima para a reserva remunerada são medidas corretas, mas com impacto financeiro reduzido. O mesmo vale para a criação de uma taxa de contribuição de 3,5% para o Fundo de Saúde, a ser implementada gradualmente até 2026.
No abono salarial, o critério de acesso será fixado em R$ 2,64 mil, corrigido pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), até atingir o limite de 1,5 salário mínimo. Embora relevante, essa medida também terá efeito fiscal modesto. Já o Benefício de Prestação Continuada (BPC) passará por ajustes que, segundo o Ministério da Fazenda, devem gerar uma economia de R$ 4 bilhões até 2026, um valor ainda insuficiente diante das demandas orçamentárias.
Outro tópico sensível do pacote são as mudanças na concessão de transferências sociais, com a aplicação de regras mais rigorosas para evitar fraudes e desperdícios. A economia estimada de R$ 5 bilhões depende de critérios ainda pouco detalhados, o que pode dificultar a sua execução. No âmbito do Congresso, por sua vez, as emendas parlamentares passarão a respeitar as regras do arcabouço fiscal; e as emendas não impositivas não poderão ter aumento real. Além disso, metade dos recursos será destinada ao Sistema Único de Saúde (SUS), gerando uma economia estimada de R$ 15 bilhões.
Ao responder um problema econômico com planos de caráter predominantemente político, o governo deixa de atacar o cerne da questão: a deterioração da relação entre dívida e PIB. Sem atacar os crescentes gastos obrigatórios, que já superam 90% do orçamento, e sem revisar as vinculações em Saúde e Educação, o espaço fiscal continuará limitado. No curto prazo, o pacote pode aliviar as pressões, mas, inevitavelmente, será necessário discutir um conjunto de medidas mais sólido. O que foi apresentado é uma solução paliativa, por isso, o debate sobre um ajuste mais profundo deve retornar em breve. Enquanto não houver mudanças estruturais, o País seguirá convivendo com um orçamento cada vez mais sufocado e com a necessidade de novas rodadas de adaptações.
Publicado por André Sacconato
Economista da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP) e membro do Conselho de Economia Empresarial e Política da mesma instituição. PhD em Economia, Relações Governamentais e Ambiente de negócios, também é professor do MBA da FIA-USP
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